Diarreia em bezerras: entenda como ela pode prejudicar o rebanho

Publicado em: 30 de abril, 2021

A diarreia de bezerras é uma enfermidade de grande importância dentro da cadeia leiteira do mundo todo. É uma das principais doenças responsáveis por perdas econômicas, uma vez que apresenta altos índices de morbidade e mortalidade (WEI et al., 2013), podendo reduzir o ganho de peso e aumentar os custos de produção. 

Neste artigo, vamos explicar melhor como ela acontece e quais cuidados devemos tomar para evitar que o problema cause prejuízos ao produtor. Confira! 

Diarreia em Bezerras

Em primeiro lugar, a diarreia em bezerras é uma doença  que é mais frequente nas três primeiras semanas de vida (BOUDA et al., 2000).  Assim, por ser a causa de mais da metade da mortalidade de bezerras em fazendas leiteiras (FOSTER, D.; SMITH, G. 2009) merece os devidos cuidados para seu controle e prevenção, a fim de minimizar os seus impactos sobre a saúde desses animais.

A diarreia pode ser desencadeada por fatores como:

  1. Agentes infecciosos (vírus, bactérias, protozoários, parasitas);
  2. Transtornos nutricionais;
  3. Fatores predisponentes (imunidade do animal, qualidade da dieta – substitutos lácteos, temperatura inadequada do leite ou ingestão irregular, ambiência – densidade populacional do bezerreiro, ventilação, umidade, dentre outros).  

Atualmente, as causas infecciosas mais significativas de diarreias neonatais nos bezerros são a Escherichia coli enterotoxigênica (ETEC), Cryptosporidium parvum, rotavírus e coronavírus (FOSTER, D.; SMITH, G. 2009).

Como identificar o agente causal?

O diagnóstico laboratorial da diarreia em bezerras pode ser feito a partir da coleta das fezes ou mesmo de SWAB da mucosa retal, mas nem sempre é imprescindível. A análise clínica e epidemiológica muitas vezes nos ajuda a chegar a esse diagnóstico.

Assim, segue abaixo uma tabela extraída do artigo Diagnóstico de Diarreia Neonatal em bezerros, publicado no Milkpoint em 2011, dos autores Carla Maris Machado Bittar e Marcelo Cézar Soares. Essa tabela nos ajuda a fazer o diagnóstico diferencial dos principais agentes causadores de diarreia. 

diarreia em bezerras

Como a diarreia prejudica o animal?

Existem patógenos capazes de causar diarreia secretória, fazendo com que o intestino desvie sua função de absorção efetiva de líquido para uma secreção efetiva de cloreto, sódio e água no lúmen intestinal. 

Dessa forma, esse aumento na secreção é maior que a capacidade de reabsorção do intestino grosso, ocasionando a diarreia. Existem ainda os patógenos que danificam as vilosidades do intestino delgado, o que resulta em falha na absorção de eletrólitos e de água (SMITH, G.; BERCHTOLD, J. 2014)

Independente do mecanismo envolvido, a diarreia desencadeia a perda de líquidos, bicarbonato de sódio, eletrólitos (Na, K, Cl) e energia. Isso leva a consequências como acidose metabólica, desequilíbrio eletrolítico, aumento do catabolismo e desenvolvimento de hipoglicemia, respectivamente. (BOUDA et al., 2000)

Quais são os principais sintomas da diarreia?

 A manifestação clínica da doença se dá por meio de sintomas como:

  •  fezes aquosas e profusas;
  •  desidratação;
  • acidose metabólica;
  •  hiponatremia;
  •  hipocalcemia;
  •  hipoglicemia;
  •  oligúria;
  •  uremia;
  •  e balanço energético negativo, levando a anorexia devido à má absorção dos nutrientes. (BOUDA et al., 2000) 

Qual o tratamento mais indicado para diarreia?

Com isso, o tratamento da diarreia em bezerras objetiva a correção das anormalidades eletrolíticas e da reposição de água, correção dos déficits ácido – básicos, fornecimento de suporte nutricional e eliminação ou prevenção de bacteremia por E. coli. A maior parte desses objetivos é alcançada por meio da fluidoterapia. (SMITH, G.; BERCHTOLD, J. 2014)

Abaixo, um exemplo de solução para hidratação oral em bezerros:

  • 1L de água +
  • 5g de sal + 
  • 6g de acetato de potássio +
  • 20g de glicose de milho

Em nossa rotina, usamos antimicrobianos de amplo espectro (por exemplo, sulfa com trimetropim) em casos onde os animais apresentam febre (temperatura acima de 39,5º C).

Como identificar o animal desidratado e calcular o tratamento? 

Segundo Facury et al. 2013, em artigo publicado na revista leite integral, na desidratação leve (6%), observa-se diminuição da elasticidade da pele, mucosas secas e saliva pegajosa, porém o animal ainda apresenta comportamento normal. 

Com 8% de desidratação, que é considerada moderada, o animal apresenta diminuição acentuada da elasticidade da pele, mucosas ressecadas e afundamento do globo ocular (endoftalmia). O animal já se encontra apático, deprimido e inapetente.

A partir de 10% de desidratação, que caracteriza um quadro grave, todos os sinais descritos acima ficam mais intensos, a apatia aumenta e o animal permanece mais tempo deitado. 

Acima de 12% de desidratação, o animal pode vir a óbito devido, dentre outras causas, à hipovolemia, levando à falência dos órgãos em função do baixo suprimento de oxigênio nos tecidos. 

Quanto ao volume:

Uma regra prática é você calcular o grau de desidratação e fazer a reposição de duas vezes esse volume, ao longo do dia. No caso da via oral, dividir em duas ou três “refeições” diárias! Por exemplo: Uma bezerra de 50Kg de peso vivo e 10% de desidratação. Seria necessário 10 litros de solução durante 24 horas!

Quanto à via de aplicação:

Normalmente, nos casos mais simples, a via de eleição é a oral. Em casos moderados ou mais graves é que usamos a via endovenosa ou até mesmo as duas.

Como prevenir?

As ações preventivas são voltadas ao periparto, à imunidade do animal e ao ambiente, procurando minimizar a condição e proliferação de patógenos. A boa condição da vaca é fator determinante para desenvolvimento futuro das bezerras, isso porque aquelas nascidas de mães subnutridas, têm maior propensão ao desenvolvimento de doenças. Além disso, distocias estão relacionadas intimamente com o baixo desempenho de bezerros e a sua maior susceptibilidade a patógenos ambientais que frequentemente causam diarreia (CHO, Y. YOON, K. 2013). Dessa forma, o monitoramento adequado do pré-parto faz-se essencial no controle e prevenção das doenças da cria. 

A transferência de imunidade passiva por meio do colostro é responsável por definir o sistema imunológico do animal frente às enfermidades para o resto da vida, por isso é crucial que haja sucesso na colostragem quando se trata da diarreia e de todas as outras doenças que podem vir a acometer este bezerro. As novas recomendações para avaliação da imunidade passiva, bem como o alvo seguem na tabela abaixo:

Existem, atualmente, vacinas multivalentes para patógenos específicos como IBR, Coranavirus, C. perfringens e E. coli, destinadas às vacas, a fim de aumentar a concentração de anticorpos específicos contra esses patógenos no colostro. (CHO, Y. YOON, K. 2013) E estas são extremamente importantes de serem incorporadas ao calendário sanitário!

Portanto, o caráter multifatorial da diarreia pode dificultar a adoção de medidas preventivas com o intuito de evitar e diminuir a sua ocorrência nas propriedades. Por essa razão, conclui-se ser essencial definir protocolos de manejo e higiene, além de buscar segui-los corretamente, procurando minimizar a incidência e os impactos da doença.

Priscila Carla de Matos – estudante de Medicina Veterinária 

Marcus Vinicius Castro Moreira- Médico Veterinário

Referências:

CHO, Y.; YOON, K. An overview of calf diarrhea – infectious etiology, diagnosis, and intervention. Journal of Veterinary Science, v. 15, n. 1, p. 1 – 17, 2014. 

WEI, S.; GONG, Z.; CHE, T.; et al. Genotyping of calves rotavírus in China by reverse transcription polymerase chain reaction. Journal of Virological Methods, v. 189, n. 1, p. 36- 40, 2013.

BOUDA, J.; MEDINA, M.; QUIROZ-ROCHA, G. Diarreia no Bezerro: etiopatogenia, tratamento e prevenção. In: GONZÁLES, F. H. D.; BORGES, J. B.; CECIM, M. (Eds.). Uso de provas de Campo e de laboratório clínico em doenças metabólicas e ruminais dos bovinos. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2000, p. 57-60.

FOSTER, D.; SMITH, G. Pathophysiology of Diarrhea in Calves. Veterinary Clinics of America: Food Animal Practice, v. 25, n. 1, p 13-36

SMITH, G. W.; BERCHTOLD J. Fluid Therapy in Calves . . Veterinary Clinics of America: Food Animal Practice v. 30, n. 2, p. 409-427.

CONSTABLE, P. D. Antimicrobial Use in the Treatment of Calf Diarrhea. Journal of Veterinary Science, v. 18, n. 1, p. 8-17.

Sites consultados:

Milkpoint 1

Milkpoint 2

Revista Leiteira integral